02 janeiro 2017

Titivillus

PARTE DO CAPÍTULO 6.7 – Titivillus – do “Manual do escritor”

Titivillus é o nome de um demônio surgido na época dos escribas medievais. Provocava equívocos nas cópias de manuscritos e códices.
Segundo anotações dos clérigos nos pergaminhos, Titivillus sempre aproveitava os vacilos e as distrações dos monges copistas para comer letras, engolir sílabas ou devorar linhas inteiras. Com o desenvolvimento da espécie, passou a se divertir às custas dos copistas. Trocava letras e palavras doces por outras menos saborosas.
No Renascimento, aposentaram os copistas, mas o diabinho voou alegremente para as tipografias, onde, entre prensas e caixas de tipos, sentia-se animado para continuar as diabruras. Apesar dos avanços da tecnologia ainda não terem criado vacina ou antídoto eficaz contra a praga. Hoje, com a internet, com os corretores ortográficos dos celulares e processadores de texto, está feliz e disposto a cometer confusões ainda maiores e com maior rapidez.
O Titivillus moderno ataca quando preenchemos os enormes formulários virtuais e, ao invés de clicarmos no botão enviar, eles embaralham nossos dedinhos gordos e clicamos delete.
Ele está mais vivo do que nunca.
Preste atenção na cara do Titivillus. Não é à toa que no jargão dos revisores a revisão final é chamada cata piolho.



Pois, vou contar o que aconteceu comigo:

Tive um mês exaustivo para entregar a tempo os escritos relidos e revisados à gráfica para atender ao cronograma exigido pela editora. Era o resultado de seis longos anos de pesquisas sobre lendas e mitologias grega, romana, celta, nórdica e germânica. Finalmente estava pronto. Saiu do virtual e foi para o papel.
Apesar de ter outros livros publicados, passei a semana sem dormir aguardando ansioso o nascimento do mais recente.
Fui até a gráfica na hora combinada e o diretor solicitou ao estagiário trazer da oficina um dos 3.000 exemplares impressos.
Segurei-o nas mãos e fiquei vermelho como a capa do livro.
A capa cinza e preta foi alterada sem minha autorização. Abri o livro e num relance encontrei meia dúzia de erros de português.
O estômago revirou-se recordando-me do capítulo sobre um demônio medieval, o legendário Titivillus. O capetinha havia chegado ao extremo. Trocou as cores da capa, alterou título, mudou até o nome do autor.
Antes que eu vomitasse revoltado, o diretor ordenou ao estagiário:
— Meu filho, o livro não é esse. Traga aquele com a capa cinza e preta.


Vários autores, por descuido na revisão,
em vez de orgulho
passaram a ter vergonha
dos próprios livros após a publicação.



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