13 maio 2016

A cor púrpura


A cor púrpura
Alice Walker
Editora Círculo do livro
258 páginas
R$ 16,00 na Estante Virtual



Este livro foi proposto e eleito pelo Clube de Leitura Leia Mulheres – Brasília. Mais um acerto de qualidade. O grupo se reúne mensalmente para conversar sobre uma obra de autora e este particularmente abre muitas possibilidades de discussão e questionamentos sobre racismo, machismo, lesbianismo, dignidade humana, direitos humanos, mas também é uma historia de resistência, superação e empoderamento de mulheres negras.
Embora não tenha visto, eu já conhecia o título por causa do filme de mesmo nome dirigido por Steven Spielberg, estrelado por Whoopi Goldberg e Oprah Winfrey e indicado para 11 Oscar’s. (não levou nenhum).
Foi escrito em 1982, vencendo o Prêmio Pulitzer no ano seguinte.
É um romance epistolar, isto é, a narração se desenvolve por cartas escritas primeiro a Deus e depois é uma correspondência trocada entre irmãs desde a adolescência até a meia idade.
A história começa numa pequena cidade da Georgia em 1906 quando Celie, uma menina de 14 anos, é estuprada seguidamente pelo pai, gerando dois filhos. Em outra violência o pai se desfaz das crianças e ainda oferece a irmã mais nova Nettie, em casamento para Sinhô, um senhor viúvo. Ela, por amor e proteção à irmã, se oferece para casar no lugar dela. É feita quase que uma escrava para cuidar da casa e filhos do primeiro casamento dele. Enquanto ele é apaixonado por Doci Avery uma sedutora cantora de blues. Celie, por não ter com quem compartilhar a dor, escreve cartas a Deus. Para piorar a situação Sinhô, acolhe a amante em casa para que Celie recupere a sua debilitada saúde.
É partir desse ponto que a história ganha nova configuração com a descoberta de Celie por outra opção sexual, tomada de consciência da dignidade e conquista da autoestima.
Posteriormente passa a receber cartas da irmã que eram escondidas pelo violento Sinhô e finalmente escreve cartas à irmã.

Apesar da apesar da abolição norteamericana ter sido proclamada em 1863 – Proclamação de Emancipação por Abraham Lincoln – ela não foi capaz de extinguir a humilhação e a violência aos negros nos Estados Unidos. Talvez até tenha motivado a criação de sociedades secretas como a temida Ku Klux Klan que objetivava manter o domínio dos brancos sobre os negros. A discriminação social foi tão grande que somente em 1967, mais de cem anos depois é que foram anuladas as últimas leis de proibição de casamentos interraciais.
É uma história pesada, dolorosa, retratando toda uma época de subjugação da mulher pelo homem e do negro pelo branco. Mas é uma grande história quando mostra a força e a superação triunfantes.


Há muitos personagens, então anotei os mais significativos:

Celie – protagonista. Feia e desajeitada, semi-analfabeta. Lutadora. Celie em inglês tem pronúncia parecida com silly que significa abobado.
Nettie – irmã protegida de Celie. Bonita, estudiosa. Missionária.
Sinhô – ou Albert – viúvo casou-se com Celie. Apaixonado por Doci Avery. Machista, arrogante e infeliz.
Doci Avery – ou dependendo da versão: Shug Avery, cantora de blues, paixão de Sinhô. Sincera, independente e má afamada.
Harpo – filho de Sinhô, casado com Sofia depois com Tampinha.
Sofia – Mulher de Harpo, foi presa pelo prefeito, depois a fez empregada doméstica. Bonita e de personalidade forte. “É o tipo de pessoa que qualque coisa que ela pega na mão fica parecendo uma arma.”
Tampinha – ou Mary Agnes – mulher de Harpo quer ser cantora também.
Grady – namorado de Doci Avery. Aproveitador.
Samuel – Reverendo, com a esposa, adotou Olivia e Adam, filhos de Celie. Como missionário levaram-nos juntos com Nettie para África.
Corrine – mulher do reverendo Samuel.

As cartas escritas (a grande maioria) é de um português capenga, de uma menina que pouco frequentou a escola. Isso cansou a leitura durante muito tempo. Depois, eu me acostumei.
Exemplifico com um parágrafo quando a amante Doci Avery já está na casa de Celie:
“A Doci tá meio entre duente e curada. Meio entre boa e má, também. Na maior parte dos dia agora ela mostra pra mim e pro Sinhô o lado bom dela. Mas hoje ela tá toda brava. Ela ri, feito uma navalha se abrindo. Diz, Ora, ora, veja quem tá qui hoje.”
E Doci retribui o carinho de Celie:
“Ele num tá mais batendo muito em mim desque você fez ele parar, eu digo. Só um tapa uma ou outra vez quando ele num tem mais nada pra fazer.”
Mas a irmã escreve bem: como quando comentou:
“Eu me lembro de certa vez quando você me contou que sua vida deixava você tão envergonhada que nem com Deus você conseguia falar a respeito, você tinha que escrever, apear de achar que você escrevia muito mal.”
Ou ainda num momento de alegria:
“Alguma coisa me tocou na alma, Celie, e como se eu fosse um grande sino, eu simplesmente vibrei.”
Em outro comentário compara os a educação norteamericana com o interior da África onde está como missionária:
“Quando falei para ela que os olinkanos não acreditavam na educação das mulheres ela disse, rápido como um raio, Eles são como os brancos da nossa terra que não querem que os negros aprendam.”
Nas inúmeras cartas observamos que as de Celie apesar de fracas na escrita são fortes em emoção enquanto as escritas por Nettie são fortes na escrita, porém fracas de emoção. O que demonstra uma enorme capacidade da autora de interpretar duas magistralmente as duas personagens.
Indico. A cor púrpura é leitura obrigatória para quem gosta de uma boa história e questiona o racismo, o feminismo e o amor acima de tudo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Gratidão por essa resenha, Roberto Klotz. Esse livro tem sido um gatilho pra mim que sempre busco defender a história dos negros e das mulheres na educação.

 
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