28 abril 2015

Fábula


Era uma vez uma formiga que caminhava sobre a bancada da minha pia.
Antes de tudo, alguns esclarecimentos são absolutamente necessários:
1– As histórias que começam comera uma vezsão contos infantis com final feliz e esta é uma fábula adulta e sem final feliz.
2 – A bancada da minha pia é preta. Entretanto, para que a gente possa ver a formiga da minha história, vou fazer de conta que a bancada é branca.
Então, como eu ia dizendo, era uma vez uma formiguinha que caminhava sobre o mármore branco da bancada da minha cozinha. Caminhava para e caminhava para . Ela estava trabalhando.
– Todas as formigas das fábulas são muito trabalhadeiras.
Ela empurrava um carrinho de supermercado, à procura de sobras comestíveis. No carrinho, até agora só havia supérfluos: uma fatia de pizza de muçarela e dois fios enrolados de macarrão miojo sabor carne. Da prateleira inferior da gôndola, ela retirou duas pipocas de micro-ondas. No corredor seguinte, topou com a cigarra e perguntou:
– Fazendo compras tão cedo? Você não está mais trabalhando na casa de shows de São Paulo?
Não, querida, aquela cigarra é outra, é a do La Fontaine. Sou muito mais bonita e charmosa. Arrumei um maridão maravilhoso, não preciso trabalhar.
Sem graça pela mancada, a formiga continuou, apressada, seu caminho. Encontrou o leão e o rato e disparou:
– Bom-dia, Majestade! Vejo que está acompanhado do seu ajudante de ordens.
Ao que o leão respondeu:
Mocinha, deixe de ser fofoqueira e vá trabalhar. O rato que roeu a rede para o leão escapar é personagem do Lobato. Este ratinho é meu novo amigo de todas as horas.
A formiga considerou que teria sido melhor ter ficado em casa, dormindo debaixo das cobertas até mais tarde.
Formiga de fábula, independentemente do autor, tem que ser trabalhadeira e falante. Voltou a empurrar seu carrinho e consultou a lista de compras: geleia, açúcar, leite condensado, bolo de chocolate, quindim, torta de morango com suspiro e creme chantili.
Da lista solicitada constava também café de garrafa térmica. Mas esta formiga não procurou por preferir chá de hortelã.
A formiga seguiu seu caminho sem torrão de açúcar e sem barra de chocolate. E deparou-se com outra formiga pilotando um carrinho mais vazio ainda.
Desta vez nada perguntou, imaginando existir alguma fábula de Esopo que tenha duas formigas conversando.

Moral da história 1:
Não se meta em cozinha de homem: tem comida salgada.
Moral da história 2:
Não se meta em história de autor não consagrado.





Nenhum comentário:

 
Search Engine Optimisation
Search Engine Optimisation