29 dezembro 2010

Indulto improdutivo

Oitocentos e noventa e cinco presos serão beneficiados com a saída especial de Natal, de acordo com dados preliminares da Subsecretaria do Sistema Penitenciário (Sesipe) da Secretaria de Estado de Segurança Pública do DF (SSP-DF). Eles serão liberados amanhã, às 10h, e devem retornar 72 horas depois, ou seja, às 10h do dia 27. CB - Saidão de Natal, 23/12/2010


– Viu só, Mané, que sacanagem. Os homens de beca nem respeitam a gente. Num vai dar tempo. Vamos ter que ser muito rápidos. Não gosto de fazer as coisas assim no grito. Pá e buf!
– Num saquei.
– Tá aqui no jornal. A gente só será liberado depois da dez da matina.
– E daí?
– Tu é muito Mané mesmo. Tem que ficar enjaulado pra aprender!
– E?
– É muito pouco tempo. Tá aqui ó! As lojas fecham às cinco.
– Onde tu quer chegar?
– Se liga rapá! Até o cara achar a chave e abrir o portão vai dar meio-dia.
– Se explica logo!
– Quer que eu faça um desenho?
– Quero que seja claro!
– Tá bom! Entre sair daqui e chegar até as lojas vamos ter muito pouco tempo. E amanhã é Natal. É nossa última chance.
– Tu acha que a família vai ficar chateada se tu chegar em casa sem presente?
– Ai meu Santo Deus! Quero sair logo daqui. Não guento ficar junto dum cara burro como tu.
– Me respeita!
– Tu num percebeu ainda que o tempo tá muito curto. As lojas fecham às cinco. A gente só chega na cidade lá pelas três. São só duas horas de loja aberta. Sem escolha! É entrar na primeira e resolver a parada.
– Tu faz assim ó: escreve num papel os nomes das pessoas para quem vai comprar presente. Na dureza que a gente tá, o melhor é ir numa loja de 1,99.
– Ninguém merece!
– Acho que tua mulher vai entender. O principal é não chegar de mãos abanando. Ela vem aqui toda semana trazer conforto. Ela sabe como são as coisas aqui. Sabe que tu tá mais duro que cassetete nas costas. Vai numa loja de 1,99 e escolhe um presente bonito. Mulhé gosta de perfume. Eu se fosse tu, escolhia um com cheiro de violeta.
– Tu tá de olho na minha horta?
– De jeito nenhum. Mulher de amigo meu, pra mim é homem.
– Tu tá insinuando que minha mulher é macho?
– Não. Eu apenas disse que nem olho por mais gostosa, eu respeito.
– Tu é muito abusado!
– Deixa quieto. A gente tava falando da nossa saída do Natal. Que tu vai ter pouco tempo para chegar até a cidade, procurar uma loja e escolher presente pro seu pessoal. Tu pode comprar um cedê para dançar um forró com a tua nêga. Fácil, barato e rápido.
– Eu gosto de fazer tudo direitinho, planejado.
– Já falei. Anota num papel e pronto. Tó aqui, tem o da minha carteira de cigarros.
– Eu não acredito!
– Tu não sabe escrever? Eu anoto. Qual é o nome dos seus filhos?
– Eu quero sair logo daqui. Tu é muito ignorante. – Dirigiu-se para a grade e gritou: – Guarda! Guarda! Me tire daqui!
– Calma. Se acalma. Olha o bom comportamento. Amanhã a gente sai. Falta pouco.
– Eu lá quero comprar presente! Será que tu não percebeu ainda que as lojas tão cheias de grana e que a gente só tem umas poucas horas para fazer a féria antes das lojas fecharem?



Outro conto cheio de ironia e humor motivado por notícia publicada no Correio Braziliense nesta semana.
Sempre às quartas feiras, antes das 18 horas e com conteúdo entre 2959 e 2997 caracteres.
E daí? Daí que viso um espaço como colunista remunerado.

28 dezembro 2010

Sapos, rãs, jias, pererecas e outros familiares



Nos hospedamos em um hotel à beira de um rio. Quando escureceu todos os anuros afinaram suas gargantas e, como num enorme coro sem maestro, desafinaram e barulharam a noite. Tanto que tivemos que aumentar o volume da nossa conversa. Num determinado momento, nós dois, ao mesmo tempo, lembramos de fechar a janela. Nós co-achamos de acabar com a festa dos sapos.

22 dezembro 2010

Mona Lisa e o relógio
















Esta semana, especialistas do Conselho Nacional de Valorização do Patrimônio Cultural e Ambiental da Itália anunciaram a descoberta de um novo detalhe na pintura da Mona Lisa: letras muito pequenas, imperceptíveis a olho nu, gravadas nas pálpebras de Mona Lisa. A novidade pode resolver um dos maiores enigmas que cercam o quadro. CB – Ciência, 18/12/2010


Entra ano, sai ano, o quadro da Mona Lisa é alvo de especulações e histórias polêmicas.
Falam que o sorriso é resultado de uma gravidez ou de que havia dado à luz há pouco tempo em função do véu típico de gestantes do século XVI. Sugerem que o rosto seria um auto-retrato do pintor vestido de mulher com a alegação de que o artista seria gay. O escritor Dan Brown defendeu a tese de que o nome da retratada é um anagrama para Amon l'Isa, em referência a antigas divindades egípcias. Historiadores franceses afirmam que Napoleão Bonaparte teria se apaixonado pelo quadro e que teria mandado pendurá-lo em seus aposentos. Conforme os jornais da época, Vincezo Peruggia furtou o quadro do Louvre para repatriá-lo à Itália. Os tablóides contam como ele fazia sexo com Mona. Para se opor à unanimidade, um psicopata jogou ácido sobre ela, danificando parte inferior da obra.
A relação de histórias curiosas é longa e não cabe em um único parágrafo. Por isso respire fundo antes de recomeçar a ler outras particularidades ou indiscrições.
Estudiosos afirmam que Mona Lisa, pintada em 1506, é Lisa Gherardini, mulher de um rico comerciante de seda de Florença. Já um historiador comprova que a obra foi pintada em 1489 e que a mulher por trás do sorriso famoso é Isabel de Aragão, Duquesa de Milão. Sigmund Freud interpretou o sorriso como sendo uma atração erótica subjacente de Leonardo pela mãe.
Por tantas informações e especulações resolvi ir direto à fonte. Telefonei para Mona Lisa. Não me perguntem o número. Nem sob tortura direi.
A nossa conversa foi bastante rápida. Eu mal a entendia por não falar italiano medieval. Ela estava bem humorada e disse que que parecia que o povo não tinha mais o que fazer, que a deixassem em paz. Que adorava Léo, mas que jamais tivera um caso com ele. Que Léo além de pintor, escultor, anatomista, cientista e inventor também era piadista. Era maravilhoso posar para o iluste artista que contava anedotas enquanto enchia a tela de cores. Ele me perguntou se eu sabia a semelhança entre uma grávida e uma tartaruga com um relógio amarrado às costas. Como eu poderia saber se o relógio ainda não havia sido inventado? Ele riu, dizendo que as duas não viam a hora. Daí ele inventou o relógio, depois colocou-o numa pequena caixa, presenteou-me e pendurou-o no meu pescoço. No quadro o relógio indicava cinco horas. Hora de término da sessão. Depois ele resolveu apagar o relógio do quadro pois o mundo não estava preparado para a falta de tempo. Foi nesse clima de bom humor que pintou o meu sorriso. Apenas isso. Não há enigmas, apenas a felicidadade.
Aí, acabou a bateria do meu celular.




Orgulhosamente apresento mais um conto cheio de humor motivado por notícia publicada no Correio Braziliense nesta semana.
Sempre às quartas feiras, antes das 18 horas e com conteúdo entre 2959 e 2997 caracteres.
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15 dezembro 2010

Xixi fora de hora


A literatura médica registra que entre 2% e 25% das crianças do mundo sofrem de disfunção do trato urinário inferior (DTUI). Para ter uma idéia da faixa em que o Brasil se posiciona nesse espectro, Giovana Teixeira Branco Vaz, professora da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, entrevistou 739 crianças de três escolas públicas. “O estudo apontou uma prevalência de 21,8%, ou seja, mais de um quinto delas é afetado”. CB – Saúde, 13/12/2010.

Teresa Cristina Tavares Miranda recebeu um telefonema da escola e saiu às pressas do trabalho para buscar Glorinha na escola. Glorinha chorava muito. Ela não estava com febre, nem havia sido mordida por nenhum coleguinha. Durante a aula fez xixi e se molhou toda. Deixou uma poça amarela sob sua cadeirinha azul. Não era a primeira vez que isso acontecia. Acontecia com frequência. Naquela semana era a terceira vez. E ainda era quarta-feira.
Apesar de ser loirinha de cabelos cacheados e dos olhinhos azuis, Glorinha era rejeitada por seus coleguinhas. Ninguém queria se sentar ao seu lado. Não emprestavam um lápis ou um caderno. Até Luciana, sua única amiga se afastou. Reclamavam que ela fedia a mijo.
Levaram a menina para um tratamento com um fisioterapeuta que rapidamente encontrou solução para o caso que já virava um pesadelo.
Em pouco tempo Glorinha estava totalmente recuperada. Voltou a sorrir e se relacionar bem com a turminha. Para a festa junina da escola foi escolhida para ser a noiva do casamento caipira.
Tudo parecia caminhar para um final feliz na casa da família dos Tavares Miranda. Parecia. Não foi bem assim. O xixi voltou a incomodar como uma cachoeira. Nem julgue você que o fisioterapeuta não trabalhou direito. Nem pense que a Glorinha voltou a se molhar. A história agora foi com o Pedrinho, irmão mais velho, 11 anos.
Pedrinho sempre fora problemático. Foi suspenso na escola por ter sido flagrado fumando no pátio. Um vizinho reclamou por ter visto o menino aos beijos com a filha de doze. Até o padre, tão piedoso, estava incomodado por Pedrinho insistir em chamá-lo de desinteressado sexual.
Quando estava no meio de uma reunião no trabalho, o doutor Tavares Miranda, jovem pai do Pedrinho, recebeu um telefonema da secretaria do clube dizendo que deveria procurar o diretor imediatamente por causa do xixi do Pedrinho.
Não recebeu maiores explicações. Percebeu pelo tom de indignação que o assunto era grave. Ameaçavam o filho de expulsão. Só porque fez xixi na piscina. Um absurdo!
– Todo mundo faz xixi na piscina. Homens e mulheres. Velhos e crianças. Por que Pedrinho não pode? Isso é pessoal! – Resmungou indignado.
Pegou o carro no estacionamento. Como pai, pensou em arregaçar as mangas para brigar com o diretor. Como advogado, esboçou mentalmente um processo judicial contra o abuso de autoridade.
Quando chegou ao clube nem pediu permissão. Entrou logo na sala do diretor.
– O que você tem contra o meu filho? Botando o dedo em riste. – Todos mijam na piscina!
– Mas não da torre de saltos.

Orgulhosamente apresento mais um conto cheio de humor motivado por notícia publicada no Correio Braziliense nesta semana.
Sempre às quartas feiras, antes das 18 horas e com conteúdo entre 2959 e 2997 caracteres.
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08 dezembro 2010

O tubarão na história


“Uma turista alemã de 70 anos morreu ao ser atacada por um tubarão quando se banhava no Mar Vermelho, diante do hotel, no concorrido balneário egípcio de Sharm El-Sheik, um dos destinos mais procurados no Oriente Médio. Horas depois da morte da idosa alemã, as autoridades locais anunciaram a captura de dois tubarões de 2m.” CB – Mundo, 06/12/2010.


Os tubarões mordem há 450 milhões de anos.
Pois é, vou lhes contar a história de uma poderosa família de tubarões cuja dinastia está instalada desde os tempos imemoriais no Mar Vermelho.
Apenas para que você, caro leitor, tenha a noção do poder desta família, eu relembro que eles ficarm muito irritados e ameaçados quando um líder religioso, Moisés, mandou abrir uma estrada ligando as duas margens do Mar. Foram privados do mais elementar direito de liberdade. Foram impedidos de ir e vir. Sentiram-se aprisionados. Foram bloqueados. Não puderam transitar livremente no sentido Norte-Sul por um período curto, mas inesquecível. Os Tubarões reclamaram, protestaram, ameaçaram processar. Para compensar o fechamento, Moisés ofertou centenas de soldados para alimentar a corte dos tubarões.
Apesar da dispensa lotada de apetitosos soldados, precisavam se prevenir contra possíveis novas intervenções humanas. A família se organizou, juntou riquezas e estudou, durante 3000 anos, diversas possibilidades. Contrataram um francês, Ferdinand Lesseps, para abrir uma rota de fuga até o mar mais próximo, o Mar Mediterrâneo. A obra foi tão bem planejada e executada que resultou em vantagem adicional de alimentar de operários todo o clã durante uma década.
Os livros não revelam tudo por falta de pesquisa dos historiadores. Estudando os hieróglifos encontrei mais fatos curiosos.
Com a morte de Ptolomeu XIV os filhos, Ptolomeu XIV e Cleópatra herdaram juntos o trono egípcio. A encantadora Cleópatra, como todos sabem era muito bonita e costumava se enfeitar com jóias e pedras de todos os quilates. Cleópatra era conhecida por adorar jóias, poder e gatos. Só alguns poucos súditos conheciam a paixão da rainha por tubarões.
Contrariando os desejos do pai os irmãos brigavam pelo poder e Ptolo (esse era o aplelido do mano) a expulsou do reino. Ela pegou carona num navio e foi parar em Roma onde seduziu o imperador Júlio César. Voltou ao Egito com o apoio dos romanos para aniquilar o exército faraônico e destronar o irmão.
Todos, incluindo Ptolo, vivos ou mortos, foram oferecidos à familia Tubarão no mar ao leste do Egito. A parentada Tubarão se banqueteou durante meses num episódio singular. As águas verdes foram tingidas de púrpura originando o nome do Mar Vermelho.
Desde então, Cleópatra sempre servia algum escravo ou desafeto aos bichos de estima. O próprio marido jamais foi encontrado depois que ele a questionou sobre trocas de cartas e olhares com o governador Marco Antônio.
Marco Antônio se juntou a Cleópatra e governaram a porção Oriental do Império Romano sempre alimentando os tubarões a partir do balneário de Sharm El-Sheik.

Um novo conto
sempre baseado em notícia de jornal .
Sempre às quartas-feiras antes das 18h.
Sempre entre 2959 e 2997 caracteres.
Sempre com bom humor.
Como um colunista à espera de um convite para um grande jornal.

03 dezembro 2010

Quem come o ovo?



Maior que o desafio de colocar um ovo em pé é repartir um único ovo à mesa de jantar de uma família.
O solitário ovo deve ser dividido sob um telhado de zinco entre uma mulher grávida, o marido e uma filhinha esquelética.
Impossível?
Todos juntaram as mãos em oração para agradecer a generosa refeição. O ovo é de avestruz e não de codorna.

01 dezembro 2010

Que país será esse?

O primeiro-ministro russo, Vladimir Putin, ganhou de presente um novo cachorro de estimação. E, como não tem idéia sobre qual nome colocar no bichinho, teve uma idéia genial: chamar o povo russo para dar sugestões. Na última quarta, Putin divulgou, em comunicado no site oficial do cargo no governo russo, que aceita sugestões de internautas para batizar o cão. CB – Você sabia?, 29/11/2010


Numa certa manhã de inverno o jornal anunciava na primeira página que a colheita de trigo foi excepcional, que a vitoriosa seleção de futebol estava com novo técnico e que o inverno não seria muito rigoroso.
Na mesma manhã os muros da capital amanheceram com letras anônimas afirmando que o técnico de futebol desapareceu misteriosamente, que o pão continua ausente nas gôndolas e que a próxima estação será sempre pior.
Na escola, a criançada aprende a biografia do grande líder da nação. É relevado que o querido presidente à frente de uma equipe dinâmica é um defensor incansável do trio saúde, segurança e educação.
Nos apertados transportes coletivos – ônibus, trem ou caçamba de caminhão – tudo pode acontecer além de assaltos e assédios. Os veículos podem até chegar no horário e às vezes ir até o destino sem quebrar.
Nas fábricas, os operários, heróis da nação, trabalham apenas 14 horas diárias e recebem, a preços simbólicos e subvencionados pela pátria, uma refeição balanceada. Exatos 300 gramas.
Nos contracheques, mês a mês os números são cada vez mais expressivos. Em aumentos sucessivos crescem os números dos impostos a pagar.
Nas repartições públicas há uma coleção interminável de carimbos. Os raros funcionários que comparecem ao serviço desconhecem a finalidade dos carimbos por isso encaminham as pessoas das filas ao próximo guichê da próxima repartição.
Nos hospitais, para compensar a falta de médicos, enfermeiros e auxiliares há pacientes espalhados nas camas, corredores e até nas prateleiras vazias de remédios.
Nas prisões de segurança máxima não há assassinos nem estupradores. Não há corruptos nem corruptores. Os ocupantes das celas são homens com as línguas cortadas por ousaram inventar mentiras à respeito das ações dos mandatários do governo.
Nas covas rasas, jornalistas ou não, estão os que se rebelaram contra o sistema e pediram eleições.
Do trono dourado do palácio, o presidente discursa em rede nacional de rádio e televisão elogiando ações e a própria generosidade. Sempre solícito com o clamor popular oferece eleições para daqui a cinco anos.
Em todas as cidades o governo promove festas com discursos, música e rojões. Nas praças e avenidas o povo comemora a bondade. Releva o tempo de espera, esquece mordaças, perdoa maldades e volta a sorrir esperançoso com o fim da ditadura.
Na exata data marcada o governante-mor convoca eleições gerais. O voto não é obrigatório. Vota quem quiser.
Apresenta uma lista com seis nomes. A população vai às urnas. Após a apuração, o nome pelo escolhido pela sabedoria popular será para batizar o novo poodle presidencial.



Ainda não fui chamado para assinar contrato com A Folha, Estadão, Correio Braziliense, Zero Hora, Estado de Minas ou Globo, mas já recebi convite para ser publicado no Tagualetras de Taguatinga e A voz de Goiânia.
Todas as quartas-feiras, até as 18 horas, apresento, no meu blog, um texto com provocação originada em artigo do Correio Braziliense. O texto é limitado entre 2959 e 2997 caracteres.
Sou persistente e acredito na qualidade e constância da minha escrita. Por isto aguardo convite para ser colunista remunerado.
 
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