15 dezembro 2010

Xixi fora de hora


A literatura médica registra que entre 2% e 25% das crianças do mundo sofrem de disfunção do trato urinário inferior (DTUI). Para ter uma idéia da faixa em que o Brasil se posiciona nesse espectro, Giovana Teixeira Branco Vaz, professora da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, entrevistou 739 crianças de três escolas públicas. “O estudo apontou uma prevalência de 21,8%, ou seja, mais de um quinto delas é afetado”. CB – Saúde, 13/12/2010.

Teresa Cristina Tavares Miranda recebeu um telefonema da escola e saiu às pressas do trabalho para buscar Glorinha na escola. Glorinha chorava muito. Ela não estava com febre, nem havia sido mordida por nenhum coleguinha. Durante a aula fez xixi e se molhou toda. Deixou uma poça amarela sob sua cadeirinha azul. Não era a primeira vez que isso acontecia. Acontecia com frequência. Naquela semana era a terceira vez. E ainda era quarta-feira.
Apesar de ser loirinha de cabelos cacheados e dos olhinhos azuis, Glorinha era rejeitada por seus coleguinhas. Ninguém queria se sentar ao seu lado. Não emprestavam um lápis ou um caderno. Até Luciana, sua única amiga se afastou. Reclamavam que ela fedia a mijo.
Levaram a menina para um tratamento com um fisioterapeuta que rapidamente encontrou solução para o caso que já virava um pesadelo.
Em pouco tempo Glorinha estava totalmente recuperada. Voltou a sorrir e se relacionar bem com a turminha. Para a festa junina da escola foi escolhida para ser a noiva do casamento caipira.
Tudo parecia caminhar para um final feliz na casa da família dos Tavares Miranda. Parecia. Não foi bem assim. O xixi voltou a incomodar como uma cachoeira. Nem julgue você que o fisioterapeuta não trabalhou direito. Nem pense que a Glorinha voltou a se molhar. A história agora foi com o Pedrinho, irmão mais velho, 11 anos.
Pedrinho sempre fora problemático. Foi suspenso na escola por ter sido flagrado fumando no pátio. Um vizinho reclamou por ter visto o menino aos beijos com a filha de doze. Até o padre, tão piedoso, estava incomodado por Pedrinho insistir em chamá-lo de desinteressado sexual.
Quando estava no meio de uma reunião no trabalho, o doutor Tavares Miranda, jovem pai do Pedrinho, recebeu um telefonema da secretaria do clube dizendo que deveria procurar o diretor imediatamente por causa do xixi do Pedrinho.
Não recebeu maiores explicações. Percebeu pelo tom de indignação que o assunto era grave. Ameaçavam o filho de expulsão. Só porque fez xixi na piscina. Um absurdo!
– Todo mundo faz xixi na piscina. Homens e mulheres. Velhos e crianças. Por que Pedrinho não pode? Isso é pessoal! – Resmungou indignado.
Pegou o carro no estacionamento. Como pai, pensou em arregaçar as mangas para brigar com o diretor. Como advogado, esboçou mentalmente um processo judicial contra o abuso de autoridade.
Quando chegou ao clube nem pediu permissão. Entrou logo na sala do diretor.
– O que você tem contra o meu filho? Botando o dedo em riste. – Todos mijam na piscina!
– Mas não da torre de saltos.

Orgulhosamente apresento mais um conto cheio de humor motivado por notícia publicada no Correio Braziliense nesta semana.
Sempre às quartas feiras, antes das 18 horas e com conteúdo entre 2959 e 2997 caracteres.
E daí? Daí que viso um espaço como colunista remunerado.

2 comentários:

Zulmar Lopes disse...

Esta série de crônicas está fantástica, Klotz. Mesmo que o espaço na grande imprensa não surja, merece virar livro.

Klotz disse...

Obrigado mestre Zulmar. Fico honrado com sua leitura.
Esta minha ousadia já rendeu contatos promissores com editores de grandes jornais.
Todo artista se alimenta com a exposição do seu trabalho. Estou muito feliz por ter encontrado mote e motivação para escrever regularmente. É certo que num período curto terei material para publicar um livro. Tenho curiosidade em saber como o destino vai me tratar. Será que todas as histórias serão baseadas em notícias do mesmo jornal?

 
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